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Cônego Celso Pedro: “A Palavra é morta; quem lhe dá vida sou eu, ao ler”

4 jul. 2025
O Cônego sempre se dedicou ao estudo das Sagradas Escrituras. Na Academia, lecionou na Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção de São Paulo, e foi reitor da UNIFAI por um período.

Na manhã do dia 27 de junho, como parte da programação da Jornada Mundial de Oração pela Santificação do Clero, a Diocese de Campo Limpo acolheu uma presença especial. O cônego Celso Pedro da Silva, figura respeitada da Arquidiocese de São Paulo, biblista por vocação e estudioso das Escrituras desde os tempos de formação, conduziu, com leveza e sabedoria, uma palestra sobre a esperança, organizada pela Pastoral Presbiteral.

Aos 89 anos, Celso Pedro é pároco da paróquia Santa Rita de Cássia no Pari, São Paulo e em sua trajetória de serviço ministerial já colaborou em diversas frentes: foi reitor de Seminário, professor da Faculdade de Teologia, assessor em diferentes pastorais e sempre um grande apaixonado pelas Sagradas Escrituras. Esta paixão o conduziu a alcançar o doutorado em Sagrada Escritura pela Pontifícia Universidade Santo Tomás de Aquino – Angelicum (Roma). Com um humor afiado e uma lucidez invejável, o cônego recebeu a equipe do Jornal Diocese em Ação logo depois da sua palestra para uma conversa descontraída. “Você pergunta o que quiser”, disse entre sorrisos, “e eu respondo o que eu souber.” Da esperança à interpretação bíblica, suas palavras foram como sementes de um Evangelho vivido com paixão e inteligência.

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Cônego Celso Pedro em palestra ao clero de Campo Limpo, antes da entrevista. — Imagem: Andrea Rodrigues.

Como o senhor avalia a animação bíblica na  Igreja hoje?

Vejo que o estudo da Bíblia tem ganhado importância. As comunidades estão preocupadas com isso, em fazer com que o povo conheça mais as Escrituras. No entanto, às vezes fica a impressão de que poderíamos fazer mais,  sobretudo encontrando metodologias mais simples, que ajudem as pessoas a entender o texto e, principalmente, a aplicá-lo à vida.

A dificuldade está na leitura ou na interpretação?

A Bíblia não é difícil. O que acontece é que nós, brasileiros, não temos o hábito da leitura. A Bíblia é palavra escrita, é texto. E quem dá vida à Palavra sou eu, ao ler. Se não tenho familiaridade com a leitura, terei dificuldade com a Bíblia. Muitas vezes, a pessoa junta uma palavra com a outra e sai outro sentido. Então, é preciso aprender a ler com cuidado e atenção.

Por onde começar a ler a Bíblia?

Primeiro, pela escuta: participar da missa dominical com atenção às leituras e à pregação. No esforço pessoal, eu aconselho começar por um texto do Novo Testamento completo: um Evangelho ou uma das cartas. Ler do começo ao fim, aos poucos, fazendo pausas, meditando. Começar sempre pelo Novo Testamento. Depois, sim, seguir para o Antigo.

Como a Bíblia fala da Esperança? Uma palavra bíblica para o Jubileu

A Bíblia inteira fala de esperança. Cada palavra ali tem, dizem, ‘setenta sentidos’. Mas se eu tivesse que destacar uma, seria a carta aos Romanos, capítulo 5, versículo 5: ‘O amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado.’ Essa é uma síntese maravilhosa da esperança cristã.

O senhor poderia apontar os benefícios do estudo bíblico?

Primeiro, na minha experiência de vida, o estudo bíblico me mostrou que o evangelho é simples, que Jesus é acessível a todos. Segundo, como sempre procuro enfatizar, para mim, o estudo da Palavra de Deus vai muito além de uma simples análise acadêmica, de um mero “estudo” no sentido frio da palavra. Eu sempre digo, e repito com carinho: “ler a Bíblia, não apenas estudá-la”. O estudo é importante, sim, para a compreensão, para o aprofundamento. Mas a leitura, a leitura com o coração aberto, é o que nos conecta verdadeiramente com o que Deus deseja dizer e nos leva à ação, à vivência do Evangelho. O estudo deve ter por motivação iluminar também a nossa ação.

Como o senhor avalia a importância do contato com a Bíblia por parte dos seminaristas?

Aos que se preparam para ser pastores do povo ou mesmo missionários, eu digo: aprendam a ler. Leiam livros. Esqueçam um pouco o celular e os eletrônicos. Além disso, é importante conhecer línguas, não necessariamente para falar, mas para ler e entender os intérpretes modernos e os textos originais. Gosto de dizer que aprender grego, hebraico, aramaico, não é o fim do mundo. Mas ignorá-los pode empobrecer nossa leitura da Palavra. Tenho visto seminaristas que, mesmo após o curso de grego, não conseguem ler uma frase simples. E sem esforço, vamos perdendo a capacidade de interpretar com profundidade a Sagrada Escritura.

A entrevista termina com um sorriso e uma ordem: “vão aprender grego vocês também”. E nos lembra, com simplicidade e autoridade, que a esperança é uma semente lançada no coração do leitor bíblico, desde que se tenha coragem de abrir o livro e deixar que a Palavra fale ao coração.

 

Cônego Celso Pedro

O Cônego Celso Pedro sempre teve profundo apreço pelas Sagradas Escrituras, dedicando-se a seu estudo desde a formação religiosa. Fez doutorado em Bíblia pela Angelicum, em Roma, após períodos de estudo em Madri e Jerusalém. Lecionou na Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção e foi reitor da UNIFAI, sem nunca deixar de atuar junto ao povo nas comunidades, seja em São Paulo, no Amazonas ou em Israel. Com uma trajetória marcada pelo serviço e pela formação, também colaborou na formação de seminaristas, atuou na CNBB em Brasília e participou da preparação de missionários em Petrópolis, além de integrar o projeto Igrejas Irmãs, no Amazonas. Hoje, reside e trabalha pastoralmente na Paróquia Santa Rita, no bairro do Pari, em São Paulo.

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